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segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

domingo, 23 de dezembro de 2007

QUICABO depois da nossa saída


Amigo David.
Junto segue mais uns testemunhos, creio que vai reconhecer alguma coisa.
Lembrasse de ter falado do poço certamente. Veja o que é que está atrás da baliza, que até está vedado?...
Vá juntando e coleccionando por que vai ser giro, e aquelas histórias que ficaram na memória são efectivamente extraordinário.
Vá dizendo alguma coisa se o site está a ficar mais valorizado.
abraço
anicetopires

QUICABO - Depois da nossa saída

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

NATAL DE 2007



Nas pedras brancas que ilumina o sol ao nascer, gravadas a sangue e lágrimas, estão os nomes dos melhores da nossa geração.

Na saudade que o tempo refina e na memória que o tempo não apaga, sobra a nossa infinita dor da perda sem remédio daqueles que, um dia, vimos finar ao nosso lado.

Neste Natal da distância restam o nosso siêncio e a nossa memória.

HONRA AOS QUE TOMBARAM PELA PÁTRIA!

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Feliz Natal

Feliz Natal a todos os visitantes e em especial a todos os camaradas do "BCAV1883"

domingo, 25 de novembro de 2007

Operação "BUTELO COM CASCAS"

RELATÓRIO DA OP. “BUTELO COM CASCAS”


Do Relatório de Operações ressalta:


SITUAÇÃO:

NT – Na sequência da actividade operacional desenvolvida, há mais de 41 anos, muito mais gordos, velhos, “usados” e anafados, mas revelando uma FRATERNAL coesão, reuniram-se as NT para atacar o Objectivo, numa linda manhã de Novembro de 2007, na região de SANTARÉM e na zona da FEIRA DO CAMPINO;
não compareceram os reforços planeados – Matos Gago e David, por se encontrarem inoperacionais.

IN – O colesterol, a hipertensão, o ácido úrico e a BT/GNR, não se revelaram ou foram previamente neutralizados.

TERRENO – Um magnífico restaurante da região de BRAGANÇA.

METEOS – Um dia resplendoroso de Outono, ainda Verão, sem nuvens, temperatura amena e sem “penduras”.

MISSÃO:
Atacar genuínas ALHEIRAS e os BOTELOS, especialidade máxima da cozinha transmontana, com o apoio de várias garrafas de uma RESERVA transmontana de reconhecida qualidade.

EXECUÇÃO:
Vindos dos eixos de ataque SEIA e LISBOA, com os mesmos itinerários de retirada, com o PI no final da auto-estrada, comparecer
à HORA H (13h30) no recinto da feira.

CONCLUSÕES:
É de assinalar a altíssima qualidade da ementa escolhida pelo HB: o BOTELO.
É uma raridade gastronómica de Trás-os-Montes e concretamente de BRAGANÇA.
Parafraseando no nosso Maior Vate:
“Vale mais experimentá-lo que julgá-lo, mas julgue-o, aquele que não puder experimenta-lo!”
Notável!

JS

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

ANGOLA

Quem conheceu estas paisagens, não pode deixar de adorar Angola.

Recordações de UM VETERANO


Caro Veterano.
Estas coisas me emocionam!...
Quando paramos para olhar para trás, constatamos com alguma nostalgia a erosão que a história nos vai deixando.
As fotos, que, conseguimos herdar, também o que nos resta, para além das memórias, óbviamente o indispensável companheirismo dos que foram connosco e que, ainda hoje conseguimos preservar, a "amizade da guerra".
Quando me fala do Poço, gostaria que me dissesse onde ele estava, para me facilitar a localização. Acredite que não lembro onde ele estava, mas prometo que vou indagar.
Quando cheguei a Quicabo, havia uma Mercedes com uma cisterna, fazia diáriamente sob escolta duas viagens ao Rio Lifune, uma de manhã outra de tarde, despejava a àgua num tanque em frente à Enfermaria, para ser distribuido pelos balneários.
Gostaria de relembrar a Fazenda do Santana, das boas e sumarentas Laranjas e das Mangas.
Quando fui para Quicabo, o alfalto estava até ao 1º Pontão por onde passava o Rio Lifune, depois desbravou-se a Mata para os lados com ampla visão, foram dois anos a construir estrada, que, quando viemos embora já tinha passado a Beira Baixa.
Cheguei a passar pela as Sete Curvas, uma zona terrível para emboscadas, com o rompimento da estrada anulou-se as Sete Curvas, em que, ficou a fazer-se por trás, aparentemente mais seguro e acabámos por ter-mos uma emboscada com zona de morte de fogo cruzado, com os fechos de entrada e saida, ainda com o grupo de assalto, que eram os que utilizavam a catana, no ultimo dia de Quicábo a 14 de Março de 1973, ficando 4. Agora imagine, que durante a comissão não tivemos assim grandes problemas, pois eles atacaram-nos com "roketes", e capturaram-nos um camarada e levaram para o Congo, andou oito noites para passar a fronteira, foi impressionante!...
Foi libertado após o 25 de Abril pela Cruz Vermelha, era C.A.R.
Vou enviar três fotos de Quicábo para ver se recorda de alguns cenários.
No mural, onde estou sentado, consta dos que tombaram, tem lá o nome de um filho de Sezabo, que foi teinador do F.C.Porto, era Hungaro. Conheci por coincidência uma irmâ, quando me contou que um irmão dela tinha morrido em combate em Angola. Perguntei a onde, e me diz que foi em Quicábo. Logo fiquei arrepiado!...
Creio que foi abatido na Birila, já me passava esta. Era um trajecto de capim muito denso.
Mais relatos farei sobre o que ficou na memória e para história.
Pois aqui já notas muito valiosas.
Um forte abraço.
anicetopires

sábado, 27 de outubro de 2007

ARMA DA CAVALARIA

ARMAS
Escudo de ouro, uma banda de vermelho;
Elmo militar de prata, forrado de vermelho, a três quartos para a dextra;
Correia de vermelho perfilada de ouro;
Paquife e virol de ouro e de vermelho;
Timbre: uma aspa de vermelho carregada de uma moleta de ouro;
Divisa: num listel de prata, ondulado, sotoposto ao escudo, em letras de negro, maiúsculas, de estilo elzevir "MERECEMOS O NOME DE SOLDADOS";
Grito de Guerra: num listel de prata, ondulado, sobreposto ao timbre, em letras de negro, maiúsculas, de estilo elzevir "À CARGA!";

SIMBOLOGIA E ALUSÃO DAS PEÇAS:
O Escudo simboliza o peito do cavaleiro realçado pela boldrié.
A Banda, donde pende a espada que só desembainha em defesa dos ideais do seu código de honra - lealdade, generosidade, desprezo pela morte, pronto a, num momento de grandeza, tudo arriscar pelo intrínseco cumprimento do dever ou porque simplesmente lhe praz a beleza ou a temeridade de um gesto. Em adusto campo de batalha ou em engalanado terreiro de liça, o mesmo anseio: enristando a lança, honrar o juramento, em frémitos de júbilo prestado, de combater pela justiça e pela fé na defesa dos fracos e das mulheres.
Grito de Guerra: sabre em punho, "À CARGA!" o cavaleiro arranca e "numa galopada desenfreada, através de uma saraivada de balas, vai completar com a carga a denota do inimigo".
Foi ao grito de guerra da Arma que a Cavalaria tantas vezes investiu, indómita e acutilante, para se cobrir de lendária glória em:
- Fuentes e Cantos "Raríssimas vezes acontece haver na guerra uma conduta mais brilhante";
- Arminon "Arrancou por meio da mais brilhante carga a vitória que o inimigo se ufanava ter alcançado";
- Macontene "Cessar fogo! Cavalaria para a frente!";
- Mufilo "Todo o quadrado os recebe com palmas e hurras";
- Môngua "A Cavalaria é recebida entusiásticamente com a Portuguesa...enquanto os landins entoam, com igual espontaneidade, o seu cântico de guerra".
Timbre: são, entre outras, estas "páginas brilhantes" que justificam Mousinho, Patrono da Arma, a quem o timbre alude, ter podido com verdade dizer:
"Por isso nós também MERECEMOS O NOME DE SOLDADOS; é esse o nosso maior orgulho".
Caçador ou dragão, lanceiro ou blindado, hoje como antanho, o cavaleiro aguarda impaciente o momento de saltar para a sela e, sabre em punho, mostrar ser digno das tradições da Arma, e ao continuar sua saga imortal, fazer jus a enfileirar na plêiade dos Centauros de epopeia.

OS ESMALTES SIGNIFICAM:
O OURO: a imortalidade da Fé e a constância e fidelidade aos ideais da Arma;
O VERMELHO: a bravura e a glória em campos de batalha, tantas vezes à custa de sangue generosamente derramado.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

REGIMENTO DE CAVALARIA 3

Armas
Escudo- De azul, dois dragões adossados de prata, lampassados, sacados e armados de vermelho, segurando nas garras dianteiras dextra e sinistra, respectivamente uma espada antiga de prata, ponta embutida de prata com alerião invertido de negro.
Elmo- Militar de prata, forrado de vermelho a três quartos para a dextra.
Correia- De vermelho perfilada de oiro.
Paquife e Virol- De azul e de prata.
Timbre- Uma cruz florenciada de verde, entre duas asas de dragão de prata armadas de vermelho.
Condecorações- Pendente do escudo a medalha de Prata de Valor Militar.
Divisa- Num listel de branco, ondulado sotoposto ao escudo, em letras negras maiúsculas, de estilo elzevir: "CONDUTA BRILHANTE NA GUERRA".
Simbologia e Alusão das Peças
- Os DRAGÕES, adossados em sinal de unidade e camaradagem, aludem ao calor e ímpeto com que os corpos de cavalaria, espadas nuas, se lançavam sobre as posições inimigas em cargas de epopeia.

- O ALEIRIÃO - águia despojada de bico e de garras - em queda, recorda as "águias" napoleónicas que tropas do Regimento obrigaram a morder o chão, vergadas na derrota. - As ASAS de dragão do timbre definem a Arma da Unidade, enquanto a CRUZ DE AVIS, localizando-a regionalmente, perpetua a velha Cavalaria de ALÉM-TEJO. - A PRATA simboliza a humildade com que a firmeza
- O NEGRO - e a bravura -
- O VERMELHO - firmavam a esperança
- VERDE - de vitória, que ao longo da história cimentaram a fama
- O AZUL - da sua brilhante actuação na guerra.
Os Esmaltes Significam
- A Prata: Humildade.

- O Vermelho: Bravura.
- O Azul: Fama.
- O Verde: Esperança.
- O Negro: Firmeza.

REGIÃO MILITAR DE ANGOLA



ARMAS
Escudo de ouro, uma Welwitchia Mirabilis em flor de verde, realçada de ouro; bordadura de vermelho.
Elmo militar de prata, forrado de vermelho, a três quartos para a dextra.
Correia de vermelho perfilada de ouro.
Paquife e virol de ouro e de verde.
Timbre: duas garras dianteiras de leão, de vermelho, passadas em aspa, erguendo um escudo de ouro com uma Welwitchia Mirabilis em flor de verde, realçada de ouro.
Divisa: num listel de prata, ondulado, sotoposto ao escudo, em letras de negro, maiúsculas, de estilo elzevir "CONSTANTE E FIEL".

SIMBOLOGIA E ALUSÃO DAS PEÇAS:
A Welwitchia Mirabilis, planta que apenas se encontra no deserto de Moçâmedes, onde resiste a todas as hostilidades do meio ambiente, e aí floresce, simboliza o esforço heróico do Exército Português em Angola e a sua tenacidade indomável na luta contra todas as adversidades, mau grado as quais, continua a cumprir a sua árdua missão.
A Bordadura de vermelho simboliza uma Região Militar.
As Garras dianteiras do leão erguendo o escudo simbolizam os braços do soldado português defendendo a província de Angola.

OS ESMALTES SIGNIFICAM:
O OURO: nobreza e pureza.
O VERMELHO: ardor bélico e força.
O VERDE: esperança e liberdade.

terça-feira, 23 de outubro de 2007

ORAÇÃO POR NÓS TODOS

ORAÇÃO DOS FIÉIS

Por todos aqueles que combateram nas Guerras em África e Deus já chamou ao Seu Reino e, em particular, pelos nossos camaradas mortos em África, na Índia Portuguesa e em Timor.
– ROGUEMOS AO SENHOR.

Também vos rogamos, Senhor, pelos nossos camaradas, que nos deixaram ao longo destes anos, e de quem, pela sua ausência, temos a mágoa sem remédio por os havermos perdido e uma profunda saudade.
– ROGUEMOS AO SENHOR.

Por aqueles, nossos camaradas de armas, que sofrem e sentem na carne a mutilação e a doença, para que Deus os ajude a mitigar o seu sofrimento e a aliviar o seu calvário.
– ROGUEMOS AO SENHOR.

Por aqueles irmãos nossos, que um dia foram o nosso Inimigo nos campos de batalha e pela defesa da sua Pátria também morreram e ficaram mutilados, que o SENHOR os guarde e bendiga, concedendo àquelas Novas Pátrias, independência, prosperidade e Paz.
– ROGUEMOS AO SENHOR.

Pelas nossas famílias, pelas nossas queridas mulheres, filhos e netos, que a Misericórdia do Senhor tem protegido, por intermédio da Virgem, Nossa Senhora do Rosário de Fátima, nossa Mãe Santíssima.
– ROGUEMOS AO SENHOR.

Para que a Mãe-África, milenar e eterna, não mais tenha guerra, nem fome, nem epidemias, nem veja seus filhos escravos.
– ROGUEMOS AO SENHOR
.

sábado, 20 de outubro de 2007

REVISITANDO EÇA DE QUEIROZ

"UM POVO VALE MUITO MAIS DO QUE OS SEUS GOVERNANTES"
- (Conde de Gouverinhos)

Os Maias

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Guerra colonial ...

Foi absolutamente confrangedor e algo até patético o programa a que assisti durante mais de 3 horas no passado dia 17 sobre o título "Guerra Colonial".
Fora os Deficientes das Forças Armadas presentes , que deram uma imagem muito menor do que a realidade daquilo que passaram e estão a passar , todos os outros participantes estavam totalmente comprometidos, tanto pessoal como políticamente e portanto não podiam nunca ver com clareza todo o problema e principalmente o principal que era quem fez e sofreu com a guerra colonial .
Daqueles participantes , poucos ou nenhum esteve presente na "guerra", estavam comodamente sentados nos seus gabinetes ou então dentro dos quartéis a mandar ir para lá a "carne para canhão", que eram os Milicianos e os Soldados .
Agora pergunto eu , quantos Milicianos e Soldados estavam lá no dito programa , como participantes ? E quantas mulheres foram ouvidas ? Não existiram nesse tempo ? Não estiveram lá ou cá a sofrer ? Não ficaram viúvas , ou sem namorados ? E as casadas que viram regressar os seus maridos estropiados à vista e muito mais sem se ver ( stress pós traumático de guerra ? Sabeis quantos militares milicianos ( soldados incluídos ) sofrem desse mal que os afecta a eles e à sua família ? Sabeis quão bem íamos preparados para o que fomos encontrar ?
Não brinquem com coisas sérias , pois pode ser que ainda um dia vos saia o tiro pela culatra

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

NATAL EM TEMPO DE GUERRA ... 9



26 de Dezembro de 1966
Quando se substituíam as munições dos carregadores e se limpavam convenientemente as armas, um soldado deixou disparar, fortuitamente, a sua arma.
A rajada matou três, e feriu mais cinco soldados.
Na enfermaria do Batalhão, os moribundos expiraram, os feridos gemeram e um dos médicos tentou, desesperadamente, reanimar um dos moribundos, em respiração boca-a-boca.
Indiferente à tragédia, num pequeno transistor, cantava-se o velho fado:
"Quando foram dizer à pobre mãe que o filho, lhe morrera lá na guerra..."


Um mês mais tarde, nos finais de Janeiro de 1967, para atacarem o mesmo objectivo do N'Galama-Piri, foram empenhadas:
13 Companhias de Atiradores;
1 Companhia de Paraquedistas;
1 Bateria de Artilharia 8.8;
Apoio Aéreo ao solo, assegurado com três parelhas de F-84 e várias parelhas de T-6.
O objectivo, suficiente para um pouco mais de uma dezena de homens, foi atacado, assim, por mais de mil e quinhentos homens.
Disseram os jornais da época ter sido um grande sucesso militar!

Nota do Autor:

– O diário do capitão, amareleceu e perdeu a pouca importância que alguma vez possa ter tido. Foi esquecido. Depois foi deitado ao lixo. Os herdeiros do capitão não gostavam de guerra e muito menos de África.


Oito anos mais tarde as armas mortíferas dos colonialistas, depois da "retirada a pé descalço" que foi a "exemplar descolonização", foram entregues aos nacionalistas. Serviram para que se matassem, uns aos outros, mais a cubanos e sul-africanos que entraram nas intermináveis batalhas, e que, décadas mais tardes, permitiram que continuasse a guerra civil.
Uma das folhas deste diário serviu para acondicionar e depois embarcar um dos milhares de caixote de munições que estavam a ser exportadas. Não se sabe, se para uma das muitas guerras nos países soberanos de África ou se para os cacos ensanguentados do que ficou dos povos desbaratados da Jugoslávia.
Aqui bem perto:
– Na Europa.

Lisboa 3.11.83

sábado, 13 de outubro de 2007

NATAL EM TEMPO DE GUERRA ... 8

24 de Dezembro de 1966.
Os dois capitães vão sentados numa Berliet, de regresso a Quicabo.
– Nunca mais chegamos!
– Com as últimas chuvadas esta merda está intransitável.
– Se calhar temos de passar a noite aqui na picada...
– Não é natural. Logo que passemos a Baixa das Bananeiras, isto andará mais depressa.
– Se os “turras” se lembram de fazer uma emboscada...
– Não me parece. Têm o papo cheio! A coluna é demasiadamente grande. Só se forem flagelações, mas à distância.
– Foi uma pena que a operação não resultasse!
– Pois foi.
– Você esteve quase no objectivo. Se ao menos tivesse queimado as cubatas, isto tinha sido um brilharete! Assim...
– Quer dizer, o sucesso da operação era queimar cubatas!?
– Não é isso que estou a dizer. Se tivesse queimado as cubatas, podia-se fazer um relatório bem diferente. Você até podia, pessoalmente, ter dado a volta àquilo.
– Essa volta de que está a falar, custaria mais uns quantos mortos e feridos. Eles estavam lá em força, como se viu!
– Por favor... são uns porcos terroristas. Isto tudo foi uma merda. Aqueles tipos da Força Aérea, tanto prometeram e faltaram! Que não tinham tecto ou a puta qu' os pariu!
– Mas era certo. Nesta época do ano, de madrugada não há tecto para jactos. O cacimbo leva muito tempo a levantar.
– Olhe, quer que lhe diga? Tudo isto foi a teimosia do comandante. Quis à viva força fazer a operação, e agora aqui tem os resultados. Sabe que mais? Agora o que me interessa é chegar a Quicabo e ver se ele me deixa ir passar uns dias a casa com a família, agora pelo Natal. O resto que se foda!
A coluna auto, ronceiramente, segue o seu caminho.
Chegou-se a Quicabo a tempo de tomar banho, fazer a consoada, comer o bacalhau e ir ao teatro que o capelão tinha esmeradamente organizado.
O “rancho,” foram as celebérrimas batatas com bacalhau. Estavam frias e o bacalhau estava muito mais salgado.
Tinha lágrimas a mais...
Como era noite de Consoada, todos comeram fraternalmente no mesmo refeitório. Não havia apetite. Havia, e com fartura, muitas bebedeiras.
Não houve Feliz Natal.

terça-feira, 9 de outubro de 2007

SITUAÇÃO DO BLOG

CAMARADAS

  1. Está terminada a estrutura técnica do blog.
  2. Faltarão alguns ajustes gráficos que serão feitos na medida em que, novas ideias surjam.
  3. Por sugestão do Helder Barreira, passaram a constar nos blogs, o nome de quem faz as respectivas postagens.
  4. Fica assim o nome «Comissão» livre, só para informação da respectiva «Comissão Organizadora», tais como, cartas, comunicações, etc..., pelo que os elementos da Comissão terão que fazer o favor de enviar os documentos desejados para o meu endereço: albertodavid@net.vodafone.pt
  5. Continuo a aguardar instruções ou pedidos, para criar as respectivas autorizações, que irão possibilitar a outros colaboradores escrever directamente no blog.
  6. Ao contrário do que se possa pensar, não temos muito tempo á nossa frente, pelo que é necessário fazer um esforço e reforçar todos os contactos possíveis com antigos Camaradas, para que o leque de colaboradores possa aumentar.
  7. Torna-se urgente aprovar ou redefinir, a estratégia seguida no blog.
  8. É necessário fazer uma boa selecção das diversas fotografias existentes assim como de Videos de encontros efectuados, ou outras informações consideradas relevantes.
  9. Seria óptimo e estimulante receber opiniões sobre o trabalho em curso, para não se perder a motivação e poder corrigir o que eventualmente possa estar menos bem.
  10. Na SIC, no programa da Fátima Lopes, em rodapé decorrem apelos à vossa participação, qualquer Camarada pode fazer o pedido de colaboração se enviar o seguinte SMS:FATIMA (espaço) NOME de quem envia a mensagem (espaço) Localidade (espaço) Mensagem pretendida enviar o SMS para o número 3363.
  11. De momento tanto eu como o Helder Barreira, estamos a trabalhar no aspecto gráfico e técnico do blog, enquanto o nosso Camarada João Sena, vai escrevendo como só ele sabe, pequenas histórias, que retratam com realidade momentos vividos.
  12. Caso persista a ideia de se fazer um livro sobre o batalhão, todo o material existente nos blogs, poderá fácilmente ser “copiado”.

  13. Alberto David

NATAL EM TEMPO DE GUERRA ... 7


Uma cratera com mais de cinco metros, está no meio do trilho. Pedaços de carne ensanguentada, pedaços de tripas, aos farrapos, estão espalhados pelas árvores.
No chão, quatro soldados parecem mortos. Não se mexem. Deitam sangue pela boca. Ainda respiram e gemem.
O capitão ajudado pelo Zé Inácio e o Constantino, arrastam os corpos para detrás das árvores, para os abrigarem do fogo, que continua.
A batalha tem gritos de raiva dos vivos, gemidos dos feridos, e muitas ordens gritadas.
A floresta virou talho. O enfermeiro não sabe a quem acudir. O capitão ajuda o enfermeiro. Com um pouco de algodão limpa o sangue que em golfadas, corre da boca de um dos soldados.
– Ai, meu capitão, que eu morro...
– Calma, pá. Isto vai-se resolver! Zé, vai dizer ao furriel que peça imediatamente evacuação heli para cinco ou seis feridos muito graves.
O tiroteio não abranda. As árvores vomitam metralha.
– Mê capitão, o furriel não consegue entrar em ligação. Diz que a mata é muito densa. Lá atrás, o nosso alferes Hélder está também cercado de “turras”. Não o deixam passar para o morro.
– Corre lá Zé. Ele não se pode deixar isolar. Senão, nunca mais saímos daqui.
– Mê capitão, aqueles bocados de carne... nas árvores, … são do Silva?
O capitão limpa o sangue da cara de um homem arrastado para fora da zona de morte. Está lívido. As árvores entram, de repente, a rodar no carrossel gigante.
Sim é verdade.
Os pedaços de carne pendurados naquele açougue, eram tudo o que restava, do que em vida, fora soldado, se chamara Silva, fora algarvio e, momentos antes estivera a seu lado, respirando o mesmo ar.
O turbilhão gira e confunde.
Tudo é real e não tem nexo.
A realidade e o pesadelo são coincidentes.
– Mê capitão, o furriel já entrou em ligação...
– Diz-lhe que peça apoio aéreo... ao menos com foguetes... e insista nas evacuações.
– Ai, meu capitão, que eu morro...
– Calma... calma... isto vai. Onde te dói?
– Todo o corpo... mas, mais no peito... não consigo respirar...
– Já está, mê capitão.
– Zé, vai ver o que se passa com o nosso alferes. Vê se já está no morro. – dirigindo-se ao soldado atirador que estava mais perto – Éh pá ... éh pá ... passa-palavra "alto ao fogo".
O soldado gritou para o outro que lhe estava próximo:
– Alto ao fogo... Alto ao fogo…
Foram minutos eternos para haver silêncio.
Os gritos de dor dos feridos, balbuciados entre dentes, pareciam estar a ser transmitidos através de uma amplificação sonora.
– Ferimos uns gajos e, no local dos rastos do sangue, encontrámos estas munições de Kalash. Os “turras” iam-nos cercando. Eram mais de cinquenta a fazer fogo à ganância. Tenho o morro controlado com três equipas – disse o Hélder com a respiração ofegante e o suor a correr pelo rosto sombreado por uma barba de três dias.
– Bem... precisamos de transportar os feridos até lá atrás. Zé, dá aí uma ajuda... pega com jeito... para não fazer doer...
– Ai... meu capitão... eu vou morrer... eu vou morrer…
– Pastilhas, dá morfina a todos os feridos, senão isto nunca mais anda. Éh pá... passa palavra… para o Marinho vir cá.
Chegou o alferes.
– Meu capitão, o Quirino salvou a malta. Assim que o Silva bateu no cordão de tropeçar, rebentou a mina. Tinha amarrada uma bomba de avião de cinquenta quilos. O Silva ficou desfeito. Os gajos estavam emboscados do lado da equipa do Quirino. Começaram a fazer tiro de rajada, a varrer. Quirino, arrastou a equipa, saltou para cima deles e atacou com granadas e fogo. Se o gajo não tivesse feito aquilo... os “turras” tinham vindo agarra-los à mão. O Madeira foi também bestial; pôs a metralhadora a cantar, e, de joelhos, obrigou os tipos a enterrar os cornos no chão!
– Está bem. Confira rapidamente o seu grupo. Veja se falta alguém ou se desapareceu algum armamento. Diga ao Hélder para fazer o mesmo.
– Como estão os feridos?
– Não sei exactamente. Parece que bastante mal. Não sei se foi do sopro da explosão, se...
A frase é interrompida. Muitos tiros e explosões de granadas. Os dois oficiais, como que sacudidos por uma mola, rastejam, saltam como coelhos e fazem fogo para a direcção onde estava o inimigo.
Os arbustos, junto ao corpo do ferido, tinham sido decepados, instantaneamente, por uma tesoura invisível.
Eles voltavam à carga.
– Marinho, temos de atirar a sua tropa para cima destes filhos da puta... senão, isto nunca mais pára. Os cabrões podem estar a armar-nos alguma ratoeira – e gritando: – Façam fogo… mas só pela certa.
Duraram alguns minutos. A manobra do grupo foi efectuada. Os guerrilheiros, mal deram conta, retiraram. As suas fardas negras eram vistas de relance. O estalar dos ramos a partirem-se e o característico som das suas automáticas, anunciavam os que ainda combatiam. Cobriam a retirada dos seus companheiros. A simbiose entre eles e o terreno era perfeita. Quando estavam a retirar gritam:
– Vai p'ro Puto, tuga
[1], filho da puta!
– Tuga... colonialistas... filhos da puta!
– Morte aos tugas salazaristas!
– Brancos cabrões. Fora dos nossa terra!
Os soldados não lhes ficavam atrás. A peixaria estava instalada!
Finalmente o tiroteio terminou.
– Mande apanhar os restos do Silva para um pano de tenda. Vamos recolher os feridos e preparar as evacuações. Veja se falta a arma de algum ferido – disse o capitão.
– Não falta. Estão todas. A do Silva ficou destruída, mas há ali umas peças retorcidas. As outras estão todas.
– Quantas são as baixas, exactamente?
– Estão a atacar a Alfa. Já têm dois mortos, e não consegui entender o número de feridos. Estão a pedir também evacuação, via rádio – disse o Alves Pereira afogueado.
– Isto não há dúvida que promete! A procissão ainda está só no adro. Vai ser um arraial dos antigos!
– Os hélis devem estar quase a chegar. Ouvi na rádio eles a pedirem a Luanda-Rádio, um avião de transporte de feridos para a Fazenda Margarido. Vão fazer as evacuações desta zona para a Fazenda.
– Temos de pôr isto imediatamente a andar. Comecem a remover os feridos. Você, Alves Pereira, continue em escuta.
– Meu capitão, o alferes Hélder já tem o morro tomado. Mas, daqui até lá, ainda é mais de um quilómetro.
– Meu capitão, do que restou do Silva, somente temos ali a cabeça com um bocado do peito, e um pé dentro de uma bota – disse o cabo enfermeiro.
– Pois é isso que se recolhe.
– Foi o que nós fizemos.
– E onde está?
– Naquele pano de tenda que o Botelho traz na mão – respondeu o Constantino.
Um soldado cabe num pano de tenda. Um outro soldado leva-o na mão, agarrado pelas quatro pontas!
Era cerca de meio-dia, quando se terminaram as evacuações. Três helicópteros baixaram, recolheram os feridos, e levaram o pano de tenda.
Só ao fim da tarde apareceu de novo o DO 27. Comunicou que no dia seguinte seria transmitida a decisão do Comando.
Mas esta não veio. Nem de manhã nem de tarde. Não havia jactos. Não havia tecto.
[1] Português

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

NATAL EM TEMPO DE GUERRA ... 6

Eram dez e doze. Uma violenta explosão soou, desencadeando infernal tiroteio. Explodiam granadas. Vibravam rajadas de metralhadora. As árvores da floresta tinham-se transformado. Os seus braços gigantes, empunhavam centos de metralhadoras. Um vulcão de metralha entrou em violenta erupção no meio da mata. O cheiro a pólvora, explosivos e sangue, torna mais difícil o respirar. Num momento, começou a cheirar a talho por todo o lado. Os soldados rebolam pela encosta fazendo fogo e procurando um abrigo.
O alferes Marinho, em grandes saltos de canguru, aparece e desaparece, articulando e manobrando o grupo de combate.
– Baixa o cu e faz fogo.
– Muda de posição, pá – grita, enquanto dava um pontapé num dos soldados que estava lívido e pregado ao chão pelo medo.
– Mexe-te, meu sacana... senão aqueles filhos da puta matam-te, meu animal.
Neste apocalipse, um grito percorre o ar.
– Enfermeiro à frente. Enfermeiro à frente.
A frase temida é transmitida de homem a homem.
O "Pastilhas", o Constantino, sem temer perigos, de cócoras e aos pulos, atravessa aqueles metros que parecem quilómetros, a toda a velocidade, seguido pelo capitão e o Zé Inácio, a sua sombra.
O espectáculo é dantesco.
Uma cratera com mais de cinco metros, está no meio do trilho. Pedaços de carne ensanguentada, pedaços de tripas, aos farrapos, estão espalhados pelas árvores.
No chão, quatro soldados parecem mortos. Não se mexem. Deitam sangue pela boca. Ainda respiram e gemem.
O capitão ajudado pelo Zé Inácio e o Constantino, arrastam os corpos para detrás das árvores, para os abrigarem do fogo, que continua.
A batalha tem gritos de raiva dos vivos, gemidos dos feridos, e muitas ordens gritadas.
A floresta virou talho. O enfermeiro não sabe a quem acudir. O capitão ajuda o enfermeiro. Com um pouco de algodão limpa o sangue que em golfadas, corre da boca de um dos soldados.
– Ai, meu capitão, que eu morro...
– Calma, pá. Isto vai-se resolver! Zé, vai dizer ao furriel que peça imediatamente evacuação heli para cinco ou seis feridos muito graves.
O tiroteio não abranda. As árvores vomitam metralha.
– Mê capitão, o furriel não consegue entrar em ligação. Diz que a mata é muito densa. Lá atrás, o nosso alferes Hélder está também cercado de “turras”. Não o deixam passar para o morro.
– Corre lá Zé. Ele não se pode deixar isolar. Senão, nunca mais saímos daqui.
– Mê capitão, aqueles bocados de carne... nas árvores, … são do Silva?
O capitão limpa o sangue da cara de um homem arrastado para fora da zona de morte. Está lívido. As árvores entram, de repente, a rodar no carrossel gigante.
Sim é verdade.
Os pedaços de carne pendurados naquele açougue, eram tudo o que restava, do que em vida, fora soldado, se chamara Silva, fora algarvio e, momentos antes estivera a seu lado, respirando o mesmo ar.
O turbilhão gira e confunde.
Tudo é real e não tem nexo.
A realidade e o pesadelo são coincidentes.
– Mê capitão, o furriel já entrou em ligação...
– Diz-lhe que peça apoio aéreo... ao menos com foguetes... e insista nas evacuações.
– Ai, meu capitão, que eu morro...
– Calma... calma... isto vai. Onde te dói?
– Todo o corpo... mas, mais no peito... não consigo respirar...
– Já está, mê capitão.
– Zé, vai ver o que se passa com o nosso alferes. Vê se já está no morro. – dirigindo-se ao soldado atirador que estava mais perto – Éh pá ... éh pá ... passa-palavra "alto ao fogo".
O soldado gritou para o outro que lhe estava próximo:
– Alto ao fogo... Alto ao fogo…
Foram minutos eternos para haver silêncio.

domingo, 7 de outubro de 2007

sábado, 6 de outubro de 2007

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Apelo ...

Solicitamos aos n/visitantes abaixo indicados, que supomos serem nossos camaradas do BCAV1883, o favor de nos contactarem via email ( albertodavid1883@gmail.com ), pois necessitamos urgente da v/colaboração e empenhamento na concretização da Comemoração dos n/4o anos :


S.Pedro do Sul
Porto
Quarteira
Arruda dos Vinhos
Covilhã
Pombal
Espinho
Madeira
Alemanha
Milharado
MonteBrison
Dublin
Braga
Almeirim

Hoje ( 5 de Outubro ), há 40 anos...

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

AO NOVO DRAGÃO





Visita do General Comandante R.M.A.

O DRAGÃO - nº.1 de Agosto de 1966

AQUARTELAMENTO DO BATALHÃO

Vista aérea do Aquartelamento do nosso Batalhão

O DRAGÃO - nº.1 de Agosto de 1966

LOUVORES

Soldado-Manuel António Brissos - www.ccav-1537.blogspot.com
Soldado-José Manuel Baptista Jorge - www.ccav-1537.blogspot.com
1º Cabo-Eusébio Craveiro Duarte - www.ccav-1537.blogspot.com
1º Cabo-João Nunes Doroteia - www.ccav-1537blogspot.com
1º Cabo-Mário dos Santos Ferreira - www.ccsbcav1883.blogspot.com
Alf.Mil.Médico-António Bernardo Carvalhais Figueiredo - www.ccav1535.blogspot.com
1º Cabo-Joaquim José - www.ccav1535.blogspot.com
Soldado-Manuel Reis Duarte - www.ccav1535.blogspot.com
-
A todos os camaradas que queiram ver os Louvores publicados no jornal O DRAGÃO, seleccionem o respectivo endereço da companhia, que se encontra a seguir ao nome.

E A BANDEIRA FLUTUA

O DRAGÃO - nº.2 Setembro de 1966

PELOTÃO MORTEIROS 1022

«Vão partir; mas deixaram a sua presença bem vincada na lembrança de todos nós»

O DRAGÃO - nº 3 de Outubro de 1966

O ADEUS AO 1022


O DRAGÃO - nº 3 de Outubro de 1966

domingo, 30 de setembro de 2007

NATAL EM TEMPO DE GUERRA ... 5

Eram já cinco horas, quando apareceu o avião.
A tropa detestava a presença destes aparelhos. Davam a conhecer ao inimigo a posição. Também porque traziam, quase sempre, presságios de má sorte. Mas nem tudo eram desvantagens. Se não fossem estas gloriosas máquinas voadoras, nunca certos comandantes haviam de ver, ao menos de longe, os sítios da guerra!
– Cobra, aqui Pardal. Leve-me à sua vertical.
Era sempre a mesma cegada. Até que não se indicasse claramente onde se estava, não ficavam satisfeitos. O capitão franziu o sobrolho e lá foi dando as indicações.
– Ok Cobra, vi perf
eitamente a sua posição. É fundamental para a festa de amanhã. Se não tem nada, Bravo Tango e terminado.
O avião afastou-se, deixando de se ouvir em poucos segundos.
A mata tropical voltou ao silêncio. Daqui até ao anoitecer, tudo seria paz na terra da guerra. Os raios de sol caminham para o rápido ocaso, violento, como a terra que iluminam, escoando-se entre o arvoredo.
O capitão sentou-se no toro de uma das muitas árvores seculares, e estendeu a carta da região no solo. Orientou a carta pela bússola e tomou notas. Com o cansaço bem estampado no rosto, limpou o suor que lhe corria com o "quico", abriu o bornal da cintura e tirou a eterna ração de combate. Como um autómato, comeu uma lata de sardinhas com um bocado de pão duro. Quando terminou, limpou a boca às costas da mão e bebeu dois golos de água morna do cantil.
Fora mais um piquenique na guerra!
Não tardou em anoitecer. Os homens descansavam e dormiram, enrolados nos panos de tenda e nos ponchos, e dormiram de um sono só. Tinham andado a pé mais de nove horas.
O inimigo não dava sinais de vida.
Choveu copiosamente durante toda a noite. Quando nasceu o sol parou de chover. O ar de neblina e a humidade, trazia o característico cheiro da mata. A atmosfera urdira nevoeiro ténue, teia quase irreal de homens, árvores, armas e raios de sol, como focos de um enorme palco.
Antes das dez horas, começou o esperado e desesperado dia D, com o avião a sobrevoar a posição.
– Cobra, aqui Pardal. Informo não ser possível efectuar o bombardeamento, porque antes do meio-dia não há tecto para os falcões
[1]. Não podemos atrasar. Desencadeie, imediatamente, o golpe de mão. O objectivo principal está no morro, azimute 82. Desça a encosta onde se encontra até encontrar um pequeno riacho. No outro lado e a cerca de cem metros do rio, começa o objectivo. As cubatas estão dispersas debaixo das árvores. O trilho leva ao objectivo. Diga se entendeu correcto. Escuto.
– Ok, Pardal, entendido. Rogo informe se Marte ou Neptuno
[2] se encontram nesse. Escuto.
– Afirmativo. É Neptuno que está transmitindo. Escuto.
– Ok, Pardal. Diga-me qual a posição de Trovão
[3] e onde posso encontrar uma clareira para fazer fogo de morteiro. Escuto.
– Trovão encontra-se junto à ponte do Totobola, na picada nova, quadrado noventa do transparente de operações. Por aqui não há clareiras para utilizar o morteiro. Tem um morro de capim, azimute 220, mais ou menos mil metros, mas não o pode utilizar. Iria atrasar a operação. Escuto.
O capitão limpou um suor frio da testa com o "quico ". Sem qualquer apoio de fogo e sem qualquer hipótese de surpresa, teria de atacar o mais forte reduto inimigo. Era impossível que não tivessem sido já detectados. O tão almejado golpe de mão, iria certamente, transformar-se numa ratoeira. Num banho de sangue!
– Cobra, aqui Pardal. Inicie imediatamente a marcha.
– Ok, Pardal. Neptuno, isto não me cheira nada bem. Escuto.
– Spartacus, aqui Neptuno. Deixe-se de considerações e cumpra a ordem. Para trás mija a burra. Boa sorte e Victor Charlie
[4].
– Obrigado, Victor Charlie.
As ordens foram transmitidas aos grupos de combate, e destes às equipas de combate.
Os soldados sabiam exactamente a quem competia ir à frente, dentro de cada grupo e dentro de cada equipa, qual era agora o primeiro.
Em combate os gestos e os actos são mecânicos e automáticos. Nunca há voluntários. Simplesmente há destino. Cada um tem o seu.
O estacionamento foi levantado e as latas das rações enterradas e disfarçadas para não poderem vir a ser utilizadas para armadilhas.
Junto do capitão veio o soldado a quem competia agora, ir à frente, receber as ordens. Era natural do Algarve. Forte e entroncado, contrasta no seu aspecto rude, a cara de menino loiro. No jeito cantado dos algarvios, interpelou:
– Meu capitão, posso fazer fogo de reconhecimento?
– Olha Silva, o fogo de reconhecimento só faz bem aos nervos. Se puderes evitar de o fazer, muito bem, se não... – voltando-se para o outro soldado que ali estava, continuou:
– Quirino, metes a tua equipa em linha, dentro da mata. Evita o trilho. Ouviste bem?
– Sim, meu capitão.
– Os comandantes dos grupos de combate e os comandantes das secções verificam o equipamento, e se todos têm as armas prontas a fazer fogo. O Madeira vai com a MG na terceira equipa. Só faz fogo para o lado direito. Deve ser desse lado que devem vir as emboscadas. No rio, quase seco, a progressão é feita por lanços. Somente depois de termos ocupado a outra margem é que se inicia a travessia. Uma equipa de cada vez. Você, Hélder, aguente deste lado, com três equipas. Tem de assegurar uma eventual retirada. Veja se não há fogo cruzado. O morteiro, a bazuca e a outra metralhadora MG ficam na minha equipa. Só fazem fogo à ordem. A bazuca emprestada pela CCS vai com o Marinho. Alguém quer fazer alguma pergunta?
Não houve resposta.
O perigo estava estampado em todos os rostos.
O capitão continuou:
– A maior atenção aos sinais de combate. Muita sorte para todos. Silva, está a andar...
O Zé Inácio bate nas costas do capitão, dizendo:
– Mê capitão, o “turra” está a dizer que aqui todos os trilhos estão armadilhados. O gajo devia ir em primeiro lugar, de "arrebenta" minas, nã é mê capitão?
– Olha, Zé aqui já não há perigo de nos perdermos. Não ouviste de madrugada o cantar dos galos?
– Ouvi, si senhor. Os filhos de uma magana devem estar aqui bem perto.
– Mais perto do que tu imaginas, Zé.

JS
(cont.)
[1] Aviões a jacto de ataque ao solo
[2] Códigos para o comandante e oficial de operações
[3] Código da companhia que ia no outro eixo em sobrapoio
[4] Viva a Cavalaria

MARCHA DO BATALHÃO - A LETRA E MÚSICA

Letra da Marcha do Batalhão de Cav. 1883
O DRAGÃO - nº 4 de Novembro de 1966


Quem não se lembra do POÇO

O DRAGÃO - nº 4 de Novembro de 1966

MENSAGEM DE NATAL

O DRAGÃO - nº 5 de Dezembro de 1966

QUERIDA MÃE




O DRAGÃO - nº 5 de Dezembro de 1966

O NATAL

O DRAGÃO - nº 5 de Dezembro de 1966

O TORREÃO

O DRAGÃO - nº 5 de Dezembro de 1966

O NATAL

O DRAGÃO - nº 5 de Dezembro de 1966

Convívio do Batalhão (2)

CONVÍVIOS DO BATALHÃO

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

NATAL EM TEMPO DE GUERRA ... 4

A coluna auto segue, em marcha muito lenta, sobre o barro pegajoso e vermelho da picada.
Cai uma viatura num dos buracos.
Os soldados montam automaticamente a segurança. Outros, água pelos joelhos, lama até aos olhos, ajudam a desatascar esta, mais aquela viatura que patina na lama.
Puxa daqui, empurra de acolá, o suor e o barro fundem-se numa crosta que lhes acentua os traços dos rostos quase imberbes.
– Ó pá solta o guincho dessa Berliet...
– Acelera um pouco... mais… mais… acelera menos... atolaste esta merda!!!
– És um nabo, ó maçarico!
– Maçarico, é a puta da tua mãe!
– Vá, agora... mete aqui uns ramos, para ver se esta merda arranca...
– Atenção à segurança! Atenção à segurança!
– Esta chocolateira já está safa. Anda lá agora tu, óh nabo!
– Isso... se acelerares certo e sem parar, essa coisa anda!
– Óh meu alferes, aquele sacana do Quirino está sempre a baldar-se.
– Olhem lá a segurança.
– Já estamos neste atoleiro há mais de duas horas.
– Éh pá, não deixes molhar a MG
– Já abriste a tua ração de combate?
– Os “turras” são uns gajos porreiros. Há tanto tempo que aqui estamos e ainda não chatearam!
– Quando chegarmos às palmeiras, as viaturas abrandam um pouco, e a malta salta em andamento. Você, que vai na testa da coluna, começa a saltar assim que passarmos o terreiro da antiga sanzala. Você, Marinho, diz aos furriéis para mandarem saltar os homens por equipas, e em numeração seguida. Cuidado com os disparos fortuitos ao saltar e a ver se não partem nenhuma G-3,
[1] ao caírem. O ponto de reunião será junto ao rio, que está em baixo e a um morro de pedra que se distingue perfeitamente. Agora escutem com atenção: esta operação não é nenhum piquenique. Será tanto mais fácil conforme os cuidados que tivermos, e evitarmos erros. Os alferes passam novamente revista ao pessoal e viaturas. Boa sorte a todos. Zé, vai dizer lá à frente para começarem a andar.


Os dois grupos de combate reduzidos iniciam a progressão apeada no terreno controlado pelo inimigo. Agora tudo pode acontecer. A marcha a corta-mato é violenta e extenuante.
Um rapaz negro, de vinte e poucos anos, um guerrilheiro capturado, serve de guia. Parece conhecer bem o terreno. Ele e os soldados já são amigos de toda a vida.
Começou a subida, a poder de catana, de um monte de densa floresta. Ao chegar ao cimo, o capitão manda fazer o primeiro alto. A paragem será de três horas. O calor e a humidade são muito fortes.
– Hélder, dê uma volta ao seu grupo de combate para ver como estão os homens. Você, Marinho, faça o mesmo. Recomendem mais uma vez que isto não é para graças. Mandem as armas pesadas para o pé de mim, e o Madeira que traga a metralhadora e enfie a clareira daquele lado da encosta. Não há fogueiras para fazer petiscos com as rações de combate.
– Quer comer alguma coisa, mê capitão?
– Obrigado, Zé. Deixa aqui a ração, e vai chamar o nosso furriel das transmissões.
– Sim, mê capitão.
O furriel Alves Pereira chegou em seguida.
– Chamou, meu capitão?
– Alves Pereira, montem uma antena horizontal para ver se temos contacto.
– O.K., meu capitão.
– Mê capitão, quer um pão com omeleta de chouriço e ovo, que eu pedi ao cozinheiro p'ra arranjar?
– És uma máquina, Zé, dá-me dali o cantil.
As nuvens ameaçam chuva. A chuva é o grande aliado dos golpes de mão. Torna mais difícil a detecção da aproximação.
Eram quase quatro da tarde. No meio de uma mata muito densa, onde se ouvia já o ruído das águas revoltas e barrentas do Dange, foi montado o estacionamento para pernoitar. Os grupos de combate tomaram as precauções rotineiras, montando em estrela, os postos de escuta de sentinelas dobradas. Os homens em qualquer parte encontravam sempre forma de se instalarem o mais confortavelmente.
Foi novamente montada a antena horizontal do posto de rádio GRc-9. Do outro lado, no Comando, o posto estava em escuta permanente.
JS
(cont.)
[1] Espingarda automática

NATAL EM TEMPO DE GUERRA ... 3

A chuva sempre forte continua a fustigar. Tamborila a chapa canelada de zinco a cobrir o posto de sentinela, alcandorado no centenário embondeiro. O motor do gerador da luz continua a roncar. Sempre forte e monótono. A alvorada ténue faz distinguir já a silhueta dos edifícios das casernas.
De repente, amanhece em África!

Bebemos uns copos, – largos! – como é costume nas vésperas das grandes operações. Avançaram até as reservas: – as garrafas de whisky que cada um tinha escondido nos seus quartos.
O tenente-capelão dava o gelo e a bênção para cada rodada.
Eram dez horas quando, meio tonto, entrei naquilo a que me tinha acostumado a chamar de meu quarto. O capitão da CCS roncava, como era costume. Às escuras deitei-me.
Penso que dormi umas duas horas.
Acordei com um terrível pesadelo. A chuva grossa cai desamparada sobre as folhas de zinco do barracão. De repente, parou. A cama foi ficando cada vez mais pequena. Os roncos do gordo capitão são cada vez maiores. O silêncio da África é absoluto. O calor é húmido e peganhento. A insónia, clara e deprimente. Como seriam os próximos dias?
Só Deus poderia saber. Esse Deus que há anos ignorara estava agora ali bem perto e eu quedava-me mudo, sem coragem para lhe falar e muito menos, pedir o que quer que fosse. Pareceria mal só me lembrar Dele quando me sentia à rasca!
O suor ficou gelado. Tenho frio em África!
Mas os soldados, os meninos grandes que eu desmamara? E as famílias que tínhamos deixado? E a Pátria que havia que defender? E a incerteza da batalha que teríamos todos de afrontar? Pelo menos para esses, Misericórdia Senhor!
E se eu morrer? É sempre trágico morrer-se aos vinte e seis anos!
Que frase mais idiota! Mas, vendo bem, pouca falta faria. O meu pai tomaria conta do rapaz e ela, nova e bonita, seguiria o seu caminho. Havia choros, recordações e a certeza de que teria morrido com dignidade. Ao menos isso! Fora esta a vida que escolhera. Eram estes os frutos que ela dava. Tudo menos ter ou revelar que, no fundo, o que tinha era medo. Só os perus morrem de véspera! Mas seria mesmo assim? E o malvado sono que não chega. A merda da cama está toda encharcada de suor.
Tenho medo. Levanto-me. Tenho de arrumar as minhas coisas. Se, por acaso... há que deixar tudo mais ou menos arrumado.
O gordo ressona e peida-se. Nunca fez cerimónia! É assim na caserna, – disse. De noite dorme com um pijama riscado, que julgo nunca ter sido lavado. De manhã veste a camisola interior, cavada e sem alças, que diz ser muito boa para prevenir constipações.
Parece que voltei às camaratas do colégio. Mas este nunca poderia ter lá andado. É velho demais. Sobretudo na alma. Não há dúvida: – podia ser meu pai! Rebola-se, ronca e sonha, e, amanhã, dirá que não conseguiu dormir e continuará a chatear-me porque as rações de combate não estão certas, e eu terei de pagar as que faltam no depósito do reabastecimento da sua, – dele – CCS. Ele pensa ser o dono da guerra. Se calhar, é mesmo! Pelo menos é o dono das rações de combate. Bem pode o Valente dizer-lhe que vem na ordem de operações, mas dali, do seu depósito de víveres, não sai nada sem requisição. Está dito e bonda!
Põe na tal requisição a soberana assinatura ou um estranho gatafunho como visto, e aponta, sempre com um lápis, – tirado da orelha, – no caderninho que trás no bolso da perna das ensebadas calças de serviço.
Já arrumei tudo. Afinal é muito menos do que pensava. Só falta atar o cordel nas malas, para depois lhe porem o lacre. Meses depois as embambas
[1] chegarão ao meu pai, como está escrito nos papéis confidenciais da guerra que todos nós assinamos, por se acaso...
De repente, amanhece em África!

O motor da luz parou.


JS

(cont)

Fotografia de " OsLuenas@groups.msn.com"
[1] Tralhas

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

NATAL EM TEMPO DE GUERRA ... 2

Na região dos Dembos a noite corre pesada. Choveu toda a noite; uma chuva contínua e grossa. A atmosfera está carregada de electricidade. A chuva tamborila nas latas onduladas que cobrem as casernas dos soldados e os outros edifícios.
Durante a noite, as sentinelas foram-se rendendo entre si, pelo simples processo de se despertarem uns aos outros. Sonolentos, num gesto automático e rotineiro, pegavam maquinalmente, na espingarda automática, que estava dependurada ao fundo da cama, e andando e bocejando, seguiam para o posto de sentinela.
À porta da caserna, a chuva torrencial batia-lhes no rosto. Só então acordavam. Voltavam atrás. Calçavam as botas, apertavam os atacadores, vestiam às avessas o poncho impermeável, com a parte de borracha para fora – só assim aquilo abrigava da chuva! – protegiam carinhosamente a arma e corriam para o embondeiro. Ai estava montado o posto de sentinela.
Um outro, que procedera de maneira idêntica, vinha completar o posto de sentinelas dobradas.
– Éh pá, chove como merda!
– Esta hora é a que mais me custa fazer. Estava a sonhar com umas gajas bestiais, quando aquele sacana do Gordinho me foi chamar!
– Óh Guerreiro, deixa-te de galgas. Não me adormeças com histórias! Hoje, em véspera de operação, estavas mas é a cagar-te com medo de o capitão te engatar. Que porra de guerreiro és tu?
– Não me "chates ", nem te ponhas para aí com bocas. Eu não tenho medo de nada. Se o capitão me não mandar p'rà guerra, é porque sabe que me dão ataques e vejo muito mal. Ele também precisa de um tipo de confiança, como eu, para tomar conta da caserna, enquanto vocês estão lá fora.
– Tu és é um "arame-farpado"!
Apalpando com os dedos a arma do camarada, continuou, com o seu sotaque arrastado de madeirense
– Olha pá… tens a bala na câmara?
– Atão nã havia de ter?
– Deixa lá ver mas é essa merda. – Sem que o outro opusesse qualquer resistência, tirou-lhe a arma da mão, sacou o carregador e, puxando a culatra atrás, fez saltar o cartucho da câmara, acrescentando: – Pega lá, não me fodas; mete o carregador no bolso. Segura bem essa porra da espingarda e aponta isso bem p'ra lá, pois o Diabo disparou uma tranca. Tu és muito nervoso e isso contagia a arma!
Acendeu um cigarro e, imediatamente, ocultou-o na mão.
– Não fumes, pá. Vem aí o sargento da ronda e dá uma bronca, a ti e a mim.
– Deixa lá. Quando eu o sentir apago a beata.
– Bem, afinal contas, ou não, esse sonho das gajas?
– Óh Madeira, tu és um gajo porreiro! Há aí uns sacanas com quem é impossível fazer guarda. Passam o tempo a implicar comigo, oferecem-me porrada e chateiam-me os cornos, porque eu gosto dos doces das rações de combate! Tu, lá na caixa, não tens lá uns docitos que me queiras dar?
– Já mo podias ter dito há mais tempo. Tenho lá uma quantidade enorme dessa merda, que deito fora.
– Para mim são muito bons!
– Não há dúvida. És um verdadeiro "arame farpado"! Se andasses na mata, nem os querias ver. Qualquer dia o capitão empurra-te para um desses PI's, onde se está parado uma semana… e então é que te vais fartar dos doces das rações! Olha que o gajo tem a mania de dizer que a guerra é para ser feita por toda a malta.
– Se ele me quiser mandar, eu alinho.
– Que remédio tens tu, pá!
– Amanhã, quer dizer, daqui por um bocado, tu alinhas p'rà operação, não é, Madeira?
Estendeu-lhe o maço de cigarros.
– Não obrigado. A mim, pá, só me saem duques! Ainda não falhei nenhuma. O capitão fode-me sempre! Como vai à bola comigo... – e imitando o falar do capitão – sô Madeira para aqui, sô Madeira para ali... – e o pobre do Madeira é quem se trama!
– Mas tu já foste louvado e vais ter o prémio Governador-Geral!
– Parece que sim. Noutro dia até mandei a folha da ordem de serviço p´rà minha, numa carta que me escreveu o Saraiva, o escriturário.
– Quantos anos tens, pá?
– Vinte e seis. Sou da idade do capitão. Quando estive no quartel de S. Martinho lá do Funchal desenfiei-me muitas vezes... e os cabrões ferravam comigo na “casa da rata”
[1]. Como eu já era casado, uma vez pedi para me deixarem ir a casa, pois já não havia que comer. Pedi ao sorja[2] da Companhia, que me arranjasse uns dias de licença. O filho da puta não me desenrascou, e eu... pus-me ao caminho e marchei p´ra casa. Tinha lá muito que fazer! A minha, tinha tido naqueles dias um rapaz, que a ia matando. Os dias foram-se passando até que uma bela manhã os “cabeças de giz” da Polícia Militar foram-me lá buscar num jeep. Azar...
– E de tropa?
– Olha, já nem sei bem... talvez uns cinco, eu sei lá... e ainda tenho de terminar esta comissão! Vim por ser “correccional”. Mandaram-me escolher entre o barril do Forte de Elvas e isto aqui! Pelo menos foi isso que me disse o primeiro que me mobilizou. Agora que já cá estou, até nem me importo muito. Ando a pensar em por aqui ficar no final da tropa. Mando vir a patroa e os putos, e toca a viver aqui! Sempre é bem melhor do que lá na Madeira!
– Mas tu bebes demais, óh Madeira!
– Na nossa terra, a gente começa a tomar bebedeiras muito cedo. Era ainda um fedelho quando o meu pai me dava a provar da rija, a aguardente de cana lá da Madeira, sempre que a minha mãe m´o mandava chamar à venda, lá no Porto Moniz. Ai que saudades tenho da nossa aguardente de cana!
– Eu só posso beber coca-cola.... como me dão ataques ....
– Grande merda! Lá no Porto Moniz, há uma mulherzinha a quem davam também ataques... sabes que horas já são, Guerreiro?
– Devem estar a dar as cinco. Temos que “dominar esta pantera”
[3] até que seja dia e nos venham render os gajos da ´CCS[4]. Já não deve faltar muito!
– E isso a ti que diferença faz? Nós vamos embora e tu vais para a caserna e metes os cornos na palha todo o dia.
– Isso é que era bom! Sempre que vocês vão p´rà mata, vou adir à CCS. O capitão é um “lateiro”, filho da puta. Passa o tempo a marrar comigo só porque sou um operacional. Depois vem o chato do major a engatar gajos p´ra irem trabalhar nas obras do poço que ele quer abrir ali na horta. O gajo é uma chaga que nem tu imaginas! Noutro dia, estava eu fechado na caserna a escrever um "bate-estradas"
[5] a umas tipas que engatei nos anúncios do Notícias de Angola, – umas gajas que adoram ser madrinhas de guerra da malta –, quando o sacana, que anda sempre a meter o nariz em tudo quanto é canto, desatou às porradas à porta. Fez-me explicar mais de cem vezes, o que estava eu ali a fazer. Chateou-me a porca e, no fim, disse que me dava um grande “porradão”[6] se me voltava a encontrar ali desenfiado. E vê lá tu, pregou comigo, eu, um doente, a cavar e a tirar terra, toda a semana, nesse maldito poço. Fartei-me de lhe dizer que me davam ataques, mas o sacana cagou-se no assunto e não fez caso. Uma semana no poço! Filho da puta!
– Olha que sempre é bem melhor trabalhar no poço do que andar na mata. No poço sempre se pode fazer sorna!
– Óh Madeira, vocês hoje vão p´rà Maria Fernanda
[7], não é verdade? Ouvi-o dizer ontem na tasca do civil. Aquilo é bem fodido!
– A mata é muito fechada e lá os “turras” têm força como o caralho!
– Éh pá... se te queres dormir um bocado encosta-te ali p´ra trás. Ai não chove. Se aparecer o sargento eu chamo-te, e não há problema.
– Tu deves estar é maluco! Assim que eu me dormisse, tu já estavas a ressonar. Depois estávamos os dois bem fodidos quando o furriel nos agarrasse a sonhar!
– Gramava que tu descansasses! Hoje tens de ir p´rà mata e ainda mais com a puta da MG às costas... deve ser pesada como um raio!
– P´ra mim dá igual. Começa mas é a contar lá essa merda do sonho!
– Foi um sonho bestial! Sonhei que estava na cama com cinco gajas muito boas... umas tipas “boazonas” lá na minha terra...
JS
(cont.)
Fotografia de " OsLuenas@groups.msn.com"
[1] Prisão
[2] Sargento
[3][3] Estar de sentinela
[4] Companhia de Comando e Serviços
[5] Aerograma
[6] Punição
[7] Fazenda de café nos Dembos e na margem direita do rio Dange